África, no contexto pós-guerra mundial, era um continente dominado por potências europeias que detinham territórios coloniais, que extraiam, que exploravam e que oprimiam as populações locais conforme os objectivos, enquanto a Europa tentava-se levantar dos escombros.
Impedidos de se expressarem livremente e lutando muitas vezes clandestinamente, muitos dos povos africanos iriam deparar-se com a entrada na Guerra Fria, sendo os EUA e a União Soviética, os dois países interessados por motivos diferentes em conseguir libertar, influenciar, e ganhar estas zonas estratégicas do globo.
A palavra de ordem era a Autodeterminação, não havendo os direitos reconhecidos, não havia espaço para redefinir estatutos, para formar a identidade colectiva, e não havendo domínio sobre os territórios, não havia como direccionar o próprio destino.
Para isso era preciso um lugar de afirmação no cenário global, havendo isso, havia possibilidade de enfrentar os obstáculos alicerçando-se na força da união.
Os únicos países independentes eram: a Etiópia, a Libéria (ambos nunca antes colonizados), o Egipto, que se tornou livre, em 1922, a Líbia que se tornou livre em 1951, e a África do Sul, que se tornou livre em 1910, mas que se encontrava em pleno regime do apartheid, portanto, a segregação e a violência ainda imperavam.
Perante este cenário, podemos falar sobre os desafios que o futebol africano teve de enfrentar. A ausência de uma estrutura que pudesse justificar as pretensões, o número reduzido de nações que pudessem inverter o monopólio de quem se opunha à democratização da modalidade naquele continente, e a discriminação e a resistência do elitismo da FIFA como maiores obstáculos.
É preciso recuar até 1953, quando decorreu o Congresso Extraordinário do principal organismo do desporto rei, em Paris, para encontrarmos as justificações apresentadas pelos povos do Norte da Europa para dificultar a inserção de África, bem como da Ásia, como membros integrantes do Comité Executivo da FIFA, e os aliados do Leste da Europa que se bateram pela integração dos dois continentes.
Entre os principais nomes que se opunham à inclusão de África, esteve o histórico presidente da FIFA, Jules Rimet, que tal como grande parte das nações europeias já se tinha manifestado contra esta matéria, quando foi debatida em Congresso, em 1950.
Mas a insistência e a pressão foi contínua, três anos depois, os povos até ali excluídos destas andanças, sem ter uma voz, auxiliados pelos seus aliados, forçaram à marcação de um Congresso Extraordinário, em Paris, em que pediam que houvesse uma reforma nos estatutos para permitir uma vaga à Ásia e a África.
Segundo relata, Paul Darby, no artigo investigativo «Africa’s Place in FIFA’s Global Order: A Theoretical Frame»:
«De um lado, estava a visão de grande parte do contingente europeu, com o Suíço, Ernst Thommen, membro do Comité Executivo da FIFA, a dar voz à crença de que Ásia e África não estavam organizados nem preparados para fazer parte do certame mundial. E do outro, estava a visão de grande parte dos aliados, como o Jugoslavo, Ratko Pleic, a justificar que a base de qualquer organização era a igualdade de direitos e obrigações de seus membros, citando um professor de Direito da Universidade de Limoges, que concluiu que a FIFA não cumpria com essas directrizes. Como tal, foi acordado que tanto a Ásia como a África poderiam vir a ter um representante no Comité Executivo.»
Mas infelizmente, os obstáculos continuaram a fazer-se sentir, um ano mais tarde, em Berna, na Suíça, no 29.º Congresso da FIFA.
«Entre si, os africanos escolheram levar o egípcio, Abdel Aziz Abdallah Salem, para ser o representante no Comité Executivo, mas Rodolphe Seeldrayers, o então vice-presidente do organismo, e futuro sucessor de Jules Rimet, alegou que a eleição de Abdel não constituía as bases necessárias para ser eleito como membro do Comité Executivo. Todavia, o delegado russo, Victor Antipenok, apelou ao direito pela inclusão de África e Ásia e criticou a posição da FIFA no que toca ao desfavorecimento para com ambos continentes.»
O lugar no Comité Executivo seria finalmente reconhecido, mas a luta pela afirmação do futebol africano teria mais capítulos pela frente, com um dado interessante, que vale a pena lembrar.
Seria em Portugal, em Lisboa, em 1956, no Hotel Avenida Palace, aquando do 30.º Congresso da FIFA, que três das nações fundadoras, Egipto, África do Sul e Sudão, sem a quarta presente, a Etiópia, por incapacidade de comparecer, estabeleceriam as bases para a criação da Confederação Africana de Futebol (CAF).
E que mais tarde seria formalizada, em 1957, na capital do Sudão, em Cartum, bem como da ideia da criação de um futuro torneio de selecções, que hoje conhecemos como o CAN (Campeonato Africano das Nações), mas que à data assumiu o nome do primeiro presidente da CAF, Abdel Aziz Abdallah Salem.