A triste história do Charlton Athletic

O que leva 250 adeptos a viajar 425km pela sua equipa, apesar desta jogar em casa?

Em 2001/02 Jorge Costa, capitão do Futebol Clube do Porto, que dali a 2 anos estaria a levantar uma liga dos campões era emprestado ao recém-promovido Charlton Athletic, um histórico clube dos arredores de Londres, fundado em 1905, com adeptos dedicados que nos anos 30 construíram o estádio onde antes apenas existiam um pântano.

Jorge Costa esteve lá apenas um ano. Enquanto levantava o troféu mais importante da sua carreira, o Charlton descia de divisão e após o grande investimento para a nova subida ter falhado, surgem os primeiros boatos de um investidor estrangeiro, que acabaria por ser recusado pela Premier League. Com as dívidas a somar, o clube ia sendo passado de administração em administração com resultados cada vez piores, até surgir finalmente um comprador… e acho que já percebemos o rumo que esta história vai tomar!

Em 2014, o milionário belga Roland Duchâtelet adquire o clube por 14 milhões de libras, juntando-o à sua rede de clubes que incluía o Standard de Liége e o Sint-Truidense, da Bélgica, o Alcorcón de Espanha, o histórico Carl Zeiss Jena da Alemanha e o Ujipest da Hungria, prometendo um investimento avultado, intercâmbio de jogadores e o regresso à Premier League nos próximos anos.

Das três promessas, apenas a do intercâmbio se materializou, numa espécie de Programa Erasmus para jogadores inaptos, aumentando o desespero e a contestação dos adeptos. Seguiram-se vários episódios caricatos, desde enviar e-mails a “sugerir” a táctica ao treinador, a despedi-lo, por não usar os jogadores que unilateralmente escolheu, usando o Football Manager como olheiro (sim…).

Começou a contestação e com a sensibilidade que caracteriza os milionários, quando se trata das paixões do povo, Duchâtelet achou por bem usar o site do clube para acusar os adeptos de “quererem que o clube falhasse” e que se não gostavam do rumo do clube, “não viessem ao estádio”. Em sequência de acções semelhantes, tinha vendido o Standard de Liége no ano anterior e chegou a processar os adeptos por declarações ofensivas nas redes sociais… um senhor!

A contestação não se fez tardar e se os cartazes e tarjas no estádio não eram o suficiente (até porque reza a lenda que Roland Duchâtelet não assistia a um único encontro do clube no qual investiu 14 milhões, desde 2014), os adeptos do Charlton resolveram ser criativos, organizando protestos como um cortejo fúnebre (com direito a caixão e tudo) do clube, numa procissão que só terminou à porta do estádio e que juntou os adeptos do Brighton, adversário desse encontro.

Nada… decidiram então encher o terreno de jogo com bolas de praia a meio do jogo, levando à sua interrupção. Nada… decidiram então enviar-lhe bilhetes para o jogo, um mapa de Londres para saber onde ficava o estádio e até um táxi a sua casa na Bélgica, para o levar ao aeroporto para ir ao jogo. Nada…

Apesar da criatividade dos protestos, Duchâtelet continuava longe e a ignorar tais acontecimentos. A 4 Março de 2017, 250 adeptos do Charlton faltaram a um jogo com o Northampton para ir a Sint-Truiden, onde residia Duchâtelet e juntamente com os adeptos do clube local, levar o protesto à sua porta, para que não mais pudesse ignorar os adeptos. Ainda tivessem eles o Jorge Costa…

Duchâtelet pôs finalmente o clube à venda, demorando dois anos a conseguir um comprador que fosse aprovado pela federação inglesa… e quem acha que esta história tem um final feliz, não recomendo que assista ao Game of Thrones…

O clube foi adquirido por um fundo saudita que no espaço de um ano fez o clube regressar à 3ª divisão (para que fique claro, estamos a falar de uma descida!) e o vendeu na primeira oportunidade ao milionário dinamarquês radicado nos Estados Unidos Thomas Sandgaard, que meses antes tentou comprar o Wigan, mas não chegou a acordo, ficou então com o Charlton…

O clube terminou a época em 7º lugar, com os mesmos pontos do 6º classificado (Oxford United), mas menos 7 golos marcados e os mesmos sofridos, diferença que ditou que ficariam de fora do playoff de subida. O The Valley está vazio, devido à pandemia e a contestação não se tem feito ouvir… em silêncio os adeptos sofrem para ver o clube regressar ao que sentem ser o seu lugar por direito, mas que cada vez mais parece ser uma miragem: a Premier League.

 

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