Com que idade se reformam os engenheiros?

Antes de Fernando Santos não tínhamos qualquer título de seleções A para mostrar, hoje temos dois. Facto! E por isso, obrigado, Sr. Engenheiro, muito obrigado. Agora temos algo para mostrar, já que não podemos demonstrar bom futebol, fio de jogo ou sequer uma tentativa de jogar para a equipa que temos.

Portugal tem tudo para ser incrível. Tem um dos melhores jogadores da história do futebol, que apesar de estar mais perto dos quarenta do que dos trinta, ainda é um dos melhores pontas-de-lança do Mundo. Tem três jogadores do campeão em título da Premier League (Bernardo Silva, João Cancelo e Rúben Dias), tem um avançado que em Liverpool conseguiu entrar no trio mais perigoso do Mundo (Diogo Jota), tem aquele que o ano passado foi o segundo melhor marcador na Bundesliga (André Silva), numa equipa mediana, apenas atrás de Robert Lewandowski). Só na Premier League (a melhor Liga do mundo) há mais de uma dúzia de jogadores “convocáveis” para a seleção. Há também portugueses em boas equipas na Bundesliga, na Serie A, na La Liga e na Ligue 1. Temos uma geração como nunca tivemos e, no entanto, jogamos o pior futebol desde 2002, com António Oliveira!

Tribuna Expresso: grandes jogos | “O Mundial2002? Não posso dizer que a culpa foi da preparação, autocarro ou avião, porque não entendo de autocarros, aviões ou preparação”

É muito difícil por uma seleção a jogar bom futebol. As pausas de seleções são curtas e os selecionadores têm de usar os jogadores que estiverem disponíveis naquela altura, lutando contra lesões, tempo de utilização nos clubes e falta de rotinas do conjunto. Ou um selecionador tem a sorte de apanhar a espinha dorsal de um clube, como apanhou Scolari a do Porto de Mourinho em 2004 ou Del Bosque a do Barcelona de Guardiola em 2010 e 2012), ou dificilmente conseguirá criar rotinas em tão pouco tempo para pôr a equipa a jogar bom futebol.

Percebo por isso a tentação de jogar pelo seguro e apostar em tácticas mais defensivas, principalmente nos jogos mais difíceis ou quando o selecionador é novo. Não consigo compreender como é que um selecionador com oito anos ao comando praticamente dos mesmos jogadores, continua a não ter algo que se pareça com um fio de jogo.

Fernando Santos: "A responsabilidade é minha"

Fernando Santos disse no final do jogo que “os jogadores não perceberam a mensagem.” Para mim a mensagem foi simples… “jogar para o pontinho.” Isto ficou patente no jogo com a Irlanda com “empatar ou ganhar 5-0 era igual”. Esta mentalidade de pautar pela mediocridade, de fazer o suficiente e segurar o empate, deu-nos um Euro, a jogar pior do que a Grécia em 2004, mas não podia durar para sempre. Os jogadores perceberam a mensagem… a mensagem é que era má, Sr. Engenheiro.

A principal função de um selecionador é a de motivar os jogadores e gerir os seus egos. Não há tempo para muito mais. A táctica é importante, sem dúvida, mas dificilmente há tempo de preparar todos os jogadores disponíveis para uma táctica e uma filosofia diferente da que têm habitualmente nos clubes, com jogadores diferentes daqueles com que jogam todas as semanas. Um selecionador tem de motivar. Tem de passar o orgulho de representar Portugal e passar essa paixão aos jogadores. Ao passar a mensagem de que nos contentamos com um empate contra a Républica da Irlanda, Fernando Santos está longe de transmitir esse orgulho e de motivar os jogadores… Fernando Santos está a dizer que jogar para o pontinho é suficiente.

Num grupo com campeões, com melhores marcadores, com finalistas e vencedores de ligas dos campeões esta mensagem não é, NÃO PODE, ser suficiente. Pior do que a figura que fizemos na Coreia e Japão em 2002, pior do que falhar o Mundial 98 ou o 94 é jogar com esta atitude… é pautarmo-nos por esta cultura do suficiente.

A única desculpa para manter um técnico no comando de uma seleção não pode ser um título conquistado há 5 anos!

Como Fernando Santos planeou o caminho de Portugal rumo à glória | UEFA EURO 2020 | UEFA.com

Criticamos Cristiano Ronaldo por a equipa jogar para ele, mas dificilmente se pode exigir que um jogador como Ronaldo não seja egoísta e não queira brilhar. O ego não é só dele de gerir, mas também do selecionador. Não devia ser Ronaldo a decidir quem bate os livres, os cantos e os pontapés de baliza, não devia ser Ronaldo a decidir o rumo de todas as jogadas de ataque. A Ronaldo deviam caber-lhe as funções que o selecionador decidir e nada mais. Ronaldo, como qualquer tipo ambicioso, quer fazer tudo e é de louvar… cabe ao líder por um travão! Se é Ronaldo o líder, então temos um problema sério de hierarquia. Porque tal como o ego de Ronaldo, é preciso gerir o de Bruno Fernandes, o de Bernardo Silva, Diogo Jota, André Silva, etc…

Por isso, obrigado Sr. Engenheiro. Muito obrigado por tudo. Agora, por favor, saia com a dignidade intacta e dê lugar a outro… seja quem for… porque nas palavras do candidato presidencial brasileiro Tiririca: “porque pior do que está, não fica…”

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