E se fosses tu o selecionador?

Porque é que Portugal, com uma equipa com tanto talento, joga tão pouco futebol?

Esta é a pergunta em que todos temos pensado amiúde ao longo dos últimos anos, mas que apenas o jornalista Hugo Filipe Martins (do zerozero.pt) teve coragem de colocar ao selecionador nacional Fernando Santos, na conferência de imprensa que se seguiu à derrota caseira de Portugal frente à Sérvia, a qual atirou a nossa seleção para o playoff de Março de 2022, a derradeira oportunidade para atingir a qualificação para o Mundial do Catar. Fernando Santos conduziu Portugal à vitória no Euro 2016 e apesar de ser justo reconhecer o mérito que teve nessa conquista, também não podemos escamotear o conjunto de circunstâncias anormais, e quiçá irrepetíveis, que nos permitiram chegar a esse título. Mais sobre a análise do Desempate ao trabalho do selecionador AQUI.

 

Se é consensual que a nossa seleção devia jogar mais e que o selecionador não está a conseguir extrair todo o potencial dos nossos jogadores, aquilo que aqui propomos, como mero exercício teórico, é simples: E se fosses tu o selecionador nacional? Mesmo sabendo que a vida real não é o Football Manager, como colocarias Portugal a jogar, quem faria parte do 11 titular, quem seriam as principais opções vindas do banco, de quem abdicavas?

 

A minha seleção

Longe vai o tempo em que o nosso país era conhecido por formar extremos em catadupa, nomeadamente, a partir de Luís Figo, a que se seguiram Sérgio Conceição, Simão Sabrosa, Quaresma, Cristiano Ronaldo e Nani (já para não recuar a Chalana e Futre), só para citar alguns. Contudo, os maiores talentos nacionais da atualidade são jogadores que apresentam maior rendimento quando jogam no corredor central: Bruno Fernandes, João Félix e, acima de todos os outros, Bernardo Silva. A isso junta-se ainda a capacidade finalizadora de Ronaldo, a qual “exige” que CR7 jogue o mais perto possível da baliza adversária nesta fase final da sua carreira. Daqui se conclui que, na minha opinião, a chave do sucesso da seleção passa por conseguir conciliar estes 4 jogadores no corredor central, com a largura a ser assegurada por 2 laterais de propensão altamente ofensiva.

 

Com a matéria-prima que tem ao seu dispor, julgo que a seleção tem todas as condições para ter uma organização ofensiva muito forte, que procure controlar os jogos com bola, evitando entregar a iniciativa de jogo ao adversário. É essencial que Bernardo, Bruno e Félix tenham muita bola, ao invés de andarem sistematicamente a correr atrás dela, a fechar corredores laterais e a ter que fazer 50 ou 60 metros em transição ofensiva, exigindo-lhes que depois ainda tenham o discernimento necessário para ferir o adversário, nas zonas onde são realmente perigosos. Contra-ataques fulminantes como o do 1º golo de Portugal à Alemanha no Europeu podem acontecer, mas serão sempre a exceção e não a regra, enquanto a seleção se mantiver no atual registo. E para se controlarem as partidas com bola, é imperativo a equipa ter uma reação muito forte à perda, que permita recuperar a posse de bola rapidamente e em zonas adiantadas do terreno, com a maior frequência possível.

 

Face ao que foi referido anteriormente, considero que o 4-4-2 losango é o esquema tático que melhor se adequa às características dos jogadores portugueses. O “losango” ganhou uma conotação algo negativa com Paulo Bento, mas a verdade é que o ex-selecionador teve algum sucesso no Sporting com esta disposição tática e Jorge Jesus também a usou no Benfica campeão nacional em 2009/2010. Dir-me-ão que as dinâmicas coletivas da equipa são mais importantes do que o esquema tático e eu tendo a concordar. Mas também concordarão comigo quando afirmo que, numa seleção, faz mais sentido adaptar o esquema tático em função das características dos melhores jogadores, ao invés de insistir num determinado modelo que nem sequer pode ser devidamente trabalhado, porque não há tempo para isso em contexto de seleção.

 

Aos 33 anos, Rui Patrício continua de pedra e cal na baliza, apesar de atravessar um período de menor fulgor, que já vem da última época no Wolves. O futuro está assegurado com Diogo Costa, que parece começar a confirmar no FC Porto o enorme potencial que se lhe reconhece desde tenra idade.

Os defesas centrais são intocáveis, mas urge encontrar uma verdadeira alternativa a Pepe.

João Cancelo está a afirmar-se esta época como um dos melhores do Mundo no seu posto específico e, como tal, é indiscutível.

No flanco oposto, Raphaël Guerreiro e Nuno Mendes são opções de qualidade, mas creio que o luso-francês leva ligeira vantagem. Ambos oferecem a necessária propensão ofensiva e não fazem da arte de defender o seu ponto forte, mas a experiência de Guerreiro permite-lhe sentir menos dificuldades nesse momento do jogo.

A posição de “trinco” é aquela que me suscita mais dúvidas. Vejo João Palhinha, Danilo Pereira ou, frente a determinados adversários, Rúben Neves, como possíveis escolhas. No meu entender, o médio leonino é o mais completo dos 3 e, como tal, a minha opção preferencial.

 

Os outros 3 médios são, para mim, intocáveis. A potência física e a capacidade de transporte de bola fazem de Renato Sanches o box-to-box ideal para complementar os criativos Bernardo Silva e Bruno Fernandes. O médio do Manchester City está no auge da carreira e é o maestro à volta do qual a seleção deve ser construída; enquanto o seu rival citadino, apesar do momento de forma de menor fulgor, pode resolver qualquer jogo com a sua meia distância, a capacidade de passe ou a sua competência na execução de bolas paradas (é inconcebível a sua não titularidade no recente jogo com a Sérvia).

 

Terá dado João Félix um passo maior do que a perna com a transferência para o Atlético de Madrid? É verdade que continua a não se conseguir afirmar de forma indiscutível no clube madrileno (e a concorrência ainda aumentou mais esta época com o regresso de Antoine Griezmann), mas o seu talento é inquestionável e a seleção não se pode dar ao luxo de o desperdiçar. Esta posição de 2º avançado é ideal para si e poderá ainda beneficiar da concentração de atenções dos defesas adversários no seu parceiro do lado.

E ao lado de Félix está, nada mais nada menos, do que Cristiano Ronaldo. O capitão da seleção revela cada vez maiores dificuldades em contribuir para um futebol associativo, mas a caminho dos 37 anos continua a ter uma capacidade de finalização temível, que só encontra paralelo em Robert Lewandowski. A sua presença na equipa é um obstáculo ao princípio da reação forte à perda da bola, mas é um risco que tem que ser corrido, porque é compensado por aquilo que Ronaldo dá à equipa: golos e mais golos. Ainda assim, a seleção só teria a ganhar se se afastasse da obsessão que existe, dentro e fora do campo, em torno de Ronaldo, independentemente da sua valia como jogador. É de tal forma colocado num pedestal que os colegas se sentem impelidos a passar-lhe a bola, mesmo quando essa não é a melhor opção, assim como assume a cobrança de quase todos os livres, quase sempre sem sucesso, apesar de ter como colegas jogadores que têm apresentado maior eficácia nas bolas paradas, nos seus clubes de origem, ao longo dos últimos anos.

 

À espreita estão Diogo Jota e André Silva. O jogador do Liverpool é mais adequado para um futebol mais vertical, que aposte na velocidade e na profundidade; já o ponta-de-lança do Leipzig, que se tem afirmado na exigente Bundesliga, garante mais presença na área, o que pode ser um trunfo relevante em jogos frente a defesas organizadas em bloco baixo.

 

E tu? Qual é a tua seleção? Dar palpites ainda não paga imposto, por isso solta o treinador de bancada que há em ti e deixa-nos a tua sugestão!

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