O Aston Villa de Steven Gerrard

Quando chegou a Ibrox Park, casa do Glasgow Rangers, Steven Gerard recebeu uma missão “simples”: quebrar o domínio do Celtic de Glasgow, e não os deixar ganhar dez de seguida. O ex-capitão do Liverpool fez exactamente o que lhe foi pedido, conquistando o título na sua segunda época ao comando dos protestantes e pintando Glasgow de azul uma vez mais.

O inglês regressa agora à Premier League, pela primeira vez sem pitons debaixo dos pés e a um clube que não é o seu (e que, curiosamente, foi aquele ao qual mais marcou enquanto jogador), o Aston Villa. Gerrard chega a Birmingham com mais uma tarefa “simples”… a de devolver o Aston Villa à glória e às noites europeias.

A cumprir a sua segunda época na Premier League, o Aston Villa é hoje uma equipa muito diferente daquela que subiu, órfã da criatividade de Jack Grealish, mas que soube (no papel) investir o dinheiro na sua venda em vários jogadores que podem dar muito aos Villains.

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A um plantel com jogadores como Ollie Watkins, John McGinn e Emiliano Martinez (um dos melhores guarda-redes da Premier League), juntaram-se no Verão nomes como Leon Bailey (o rapidíssimo extremo jamaicano, ex-Leverkusen), o criativo Emi Buendía (ex-Norwich) e o matador Danny Ings. O plantel do Aston Villa está repleto de talento sendo (mais uma vez) no papel um candidato muito sério à metade superior da tabela.

A ausência do seu principal criativo e alguma insegurança defensiva, levaram a que o treinador Dean Smith optasse por uma mudança táctica esta época, optando por um 5x3x2, que lhe atribuía não só mais um homem na defesa, como permitia a coexistência de Ollie Watkins (melhor marcador do Aston Villa a época anterior) e Danny Ings, um dos melhores marcadores da Premier League nas últimas duas épocas, recém-contratado por 30 milhões ao Southampton. No entanto, a táctica alienava extremos como o recém-chegado Bailey e a dupla Bertrand Traoré e El Ghazi, essenciais na manutenção do Villa a época passada, além de obrigar Buendía e John McGinn a papéis muito mais defensivos do que aqueles a que estavam habituados, prejudicando a sua performance. O Villa passou de uma equipa interessante a (mais uma) equipa de contra-ataque e com a linha de água teimosamente perto, a ambiciosa direção dos villains optou por despedir Dean Smith.

Chega então Steven Gerrard, fresco da conquista de um título na Scottish Premier League e uma das maiores esperanças do futebol inglês, particularmente parco no que toca a bons treinadores nacionais (nenhum treinador inglês venceu a primeira divisão inglesa, desde o início do formato da Premier League em 1992).

Gerrard venceu o título escocês alinhando com um 4x3x3 com os extremos numa posição muito interior e os laterais muito ofensivos, especialmente o direito, Tavernier. O meio-campo era mais forte e lutador do que propriamente criativo, mas ainda assim, sabiam subir, criar e várias vezes aparecer à segunda bola do avançado. O trio de ataque era composto pelo explosivo Ryan Kent, Kemar Roofe, que de ponta-de-lança no Leeds de Bielsa e no Anderlecht passou a segundo avançado na Escócia, ambos atrás de Alfredo Morelos, a principal referência ofensiva da equipa.

O principal desafio de Gerrard não deve ser o de pôr a equipa a jogar e a perceber as suas ideias, pois matéria-prima tem muita. A sua maior dificuldade vai ser a transição de uma equipa que ganha praticamente todos os jogos domésticos, a maioria deles sem muita dificuldade, para uma equipa que praticamente todas as semanas joga com adversários de um nível igual ou superior.

No Aston Villa, Steven Gerrard encontrará um plantel com o qual facilmente pode replicar muitas das suas rotinas em Glasgow. Em Matty Cash tem um lateral direito igualmente ofensivo, em McGinn, em Leon Bailey tem a mesma capacidade de explosão que tinha em Ryan Kent, em Buendia a criatividade de Hagi e quer em Ings, quer em Watkins, avançados ainda mais letais do que Morelos ou Roofe. Mantendo a sua filosofia de jogo, Gerrard poderá apostar numa defesa a quatro, com Targett como lateral mais conservador e Matty Cash mais ofensivo, o meio-campo com McGinn, Douglas Luiz e nos jogos mais difíceis talvez Sanson ou até Nakamba, e naqueles que precise de mostrar iniciativa de jogo, Emi Buendía. Na frente de ataque, Leon Bailey deverá fazer uma das alas, Ollie Watkins na outra a aparecer muitas vezes como segundo-avançado, atrás de Danny Ings.

Steven Gerrard e o Aston Villa não são o casamento perfeito. Todos sabem que o treinador ama outro clube, no qual é visto com o sucessor natural de Jurgen Klopp e o Aston Villa tem um projecto a longo prazo, para o qual deveria ter procurado um treinador com os mesmos objetivos. Ainda assim, e apesar de ter os dias contados à partida, é um casamento que tem tudo para ser feliz.

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