Chalupas da bola: Peter Drury, o Poeta do Futebol

Peter Drury - o Poeta do Futebol

Pelé, Maradona, Ronaldo, Messi, Zidane, Cruijff e Peter Drury. O que têm em comum? Pouca coisa, pode-se dizer, mas partilham dois atributos que os distinguem do resto dos mortais. Têm o génio e a capacidade de nos fazerem vibrar com esta coisa que, para muitos, simplesmente não passa de “22 homens atrás de uma bola”.

Peter Drury é a prova cabal e vocal disso mesmo. São pessoas como ele que nos mostram que este jogo pode ser muito mais do que um simples exercício de transporte de uma esfera de um lado para o outro, pelo menos a que está no relvado. É um exercício do movimento de um esférico bem maior, que é o Globo, à espera de algo que, por momentos, nos faça esquecer, a muitas vezes dura condição humana

No passado dia 11 de setembro, mais uma ode foi escrita pelo comentador inglês. Não foi uma de Homero. Não! Foi melhor. Foi muito melhor! Foi sobre futebol:

Madeira, Manchester, Madrid, Turim, e Manchester outra vez, rodeado de vermelho. Regressado até à grande galeria deste “Jogo”, uma obra de arte caminhante, vintage, com um valor inestimável, sem possível falsificação, ou imitação. São 18 anos desde que aquele tremelicante adolescente de aparelho nos dentes, agora na sua imaculada maturidade, primeiro calcorreou este histórico estádio.CR7 – Reunido!

 

A fineza da descrição de Peter Drury a Ronaldo faria o próprio CR7 corar de vergonha, que, provavelmente não é muito destas coisas.

A forma como Peter Drury usa a voz, a entoação e as palavras vai bem para além do que é o mero comentário desportivo. É uma forma de arte. É magia sonora. É a loucura no seu mais puro estado ébrio!

Mas se a mais incrível introdução de todos os tempos à entrada de um jogador de futebol (ou de quem quer que seja) não chega para algum leitor, nos golos que Ronaldo marcou ao Newcastle no passado dia 11, a descrição conseguiu ser ainda mais espetacular do que os tentos.

Greenwood teve um remate, e adivinhem quem lá está?! Fechem os olhos. Ele nunca se foi embora daqui.À procura de Ronaldo. É o Ronaldo. É 2-1 para o United. O “Teatro” vive o seu sonho

Para os mais interessados na “obra” de Peter Drury podem ler mais alguns excertos de como o relato do futebol pode muito bem assumir a beleza estética da literatura:

Roma levantou-se das suas ruínas. Manolas, o deus grego em Roma… O inimaginável abre-se perante os vossos olhos! Isto não era para ter acontecido! Isto não poderia acontecer! Está a acontecer! Barcelona, extraordinariamente, está a oito minutos da eliminação! E Di Francesco não sabe para onde há de ir, Iniesta não sabe para onde olhar. É um grego oriundo do Monte Olimpo que veio às Sete Colinas de Roma e sacou um milagre

Comentou quando a Roma venceu 3-0 ao Barcelona, depois de ter perdido fora por 4-1 na Champions League em 2018.

 

Mas há mais.

É um dia memorável. Ederson fica para se esconder. É a vez de Solskjaer de olhar para o Paraíso e dizer: Eu fiz um duplex mesmo em cima dos vizinhos.

Afirmou quando os “Red Devils venceram 2-0.

 

 

O mais incrível é que estas frases são ditas ao sabor do momento, sem qualquer preparação prévia, como afirmou numa entrevista.

Golo dos Bafana-Bafana. Golo da África do Sul. Golo para toda a África.”

Afirmou no Mundial de 2010, quando Tshabalala marcou frente ao México no país que acolhia a maior competição internacional de nações.

Mas que golo, e em que altura, e em que sítio, e que jogador!

 

 

O britânico de 53 anos, que descreve a sua voz como “bela, autoritária e poética”, está aí para as curvas e ameaça continuar continuar a povoar-nos a imaginação, pelo menos, enquanto não nos mata do coração, com os seus relatos espetaculares.

 

Outro poeta em terras de Poetas

A Terra de Sua Majestade é profícua em homens letrados que narram futebol. Peter Drury, não é o único poeta do futebol, outro comentador, Martin Tyler é até uma figura mais consensual nesta coisa de relatar os jogos. Com frases mais curtas, mas mais melódicas e apaixonadas, poderíamos dizer que Tyler segue uma linha mais simples, mas igualmente arrebatadora.

É um exemplo de uma imagem de marca da Premier League. Foi eleito o comentador da década da competição em 2003. Tem 76 anos e, para além de ser comentador desportivo é ainda treinador adjunto do Woking, clube que torce desde a infância. Um verdadeiro maluco por futebol, portanto. Mas, como em muitas coisas, nesta vida, a nova vaga pode muito bem superar a mais antiga. Temos entre Peter Drury e Martin Tyler um verdadeiro confronto de titãs que poderá ser quase tão interessante como o de Ronaldo e Messi.

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