Spartak 0-2 SLB | E tudo João Mário mudou

Dadas as incorporações recentes no plantel de Meïté e Yaremchuk, o Benfica apresentou-se em Moscovo com um 11 inicial apenas com um reforço, João Mário, que jogou na posição habitualmente ocupada por Taarabt em 20/21.

Em função da preferência demonstrada por Jorge Jesus, desde que Lucas Veríssimo foi contratado em Janeiro (e sempre que o brasileiro, Otamendi e Vertonghen estiveram disponíveis em simultâneo), a opção pela estrutura com 3 defesas-centrais não surpreendeu. A pré-época poderia deixar indícios de que tal não fosse acontecer, uma vez que Jorge Jesus utilizou quase sempre o 4-4-2 nos jogos de preparação. Contudo, isso deveu-se à integração tardia destes 3 elementos: Lucas Veríssimo iniciou a pré-época ainda a debelar uma lesão contraída na última jornada do campeonato (que o impediu de participar na final da Taça de Portugal e na Copa América), Vertonghen chegou a meio da preparação em virtude da presença no Europeu e Otamendi apenas se juntou à equipa na antevéspera do último amigável.

 

Nos minutos iniciais da partida ficou evidente a predisposição da equipa do Benfica para pressionar alto, de forma a impedir ou condicionar a construção a partir de trás por parte do Spartak. Esta característica já tinha ficado patente nos jogos amigáveis e promete ser algo que vamos ver mais vezes esta época. No caso concreto do jogo de Moscovo, os extremos do 3-4-3, Pizzi e Rafa, saíam aos centrais da formação russa, enquanto o ponta-de-lança, primeiro Seferovic e depois Gonçalo Ramos, ocupava-se do trinco adversário. Mesmo sem somar um número elevado de recuperações de bola em zona adiantada do terreno, o Benfica nunca permitiu que a equipa da casa se sentisse confortável com bola.

 

Pelo contrário, o Spartak, apesar de também pressionar alto o adversário, nunca encaixou no sistema tático do Benfica. Os encarnados não sentiram grandes dificuldades na 1ª fase de construção e quando ultrapassavam a 1ª linha de pressão adversária, Weigl e João Mário conseguiam invariavelmente descobrir os alas, sobretudo Diogo Gonçalves, com bastante espaço para progredir com bola. Não foi por isso de estranhar que a maioria dos lances perigosos do ataque benfiquista na 1ª parte tivessem nascido desta forma.

 

Ao intervalo, o nulo mantinha-se, mas o jogo “parecia fácil”, tão notória que era a superioridade individual e coletiva do Benfica. Faltava, no entanto, o(s) golo(s) que confirmasse(m) esse ascendente, o que colocava os encarnados à mercê de um hipotético volte-face, daqueles em que o futebol é tão pródigo.

 

Apesar das 4 oportunidades de golo desperdiçadas (duas conclusões de Pizzi após cruzamentos rasteiros atrasados, um cabeceamento de Diogo Gonçalves para grande defesa de Maksimento e um remate em trivela de Rafa que saiu muito perto do poste), ficava a sensação de que o Benfica não conseguia produzir tanto volume de jogo ofensivo quanto seria possível. A meu ver, este 3-4-3 exige que, em organização ofensiva, os extremos sejam os principais criadores no último terço, quer através de ações individuais de desequilíbrio, para finalizar ou servir o ponta-de-lança, quer através do jogo associativo com os médios-centro (neste caso, mais João Mário, uma vez que Weigl joga mais recuado) e com os alas. E se Rafa cumpriu bem esse papel na 1ª parte, ainda que nem sempre seja exemplar na tomada de decisão, ou na definição das jogadas (apesar da melhoria significativa que vem revelando nestes momentos do jogo), já Pizzi praticamente só apareceu para finalizar as jogadas construídas pelos colegas, deixando a equipa um pouco “coxa”, no que a este aspecto diz respeito.

 

Ficava ainda muito claro da 1ª parte de Moscovo que todo o jogo ofensivo do Benfica 21/22 vai passar pelos pés (e especialmente pelo cérebro) de João Mário. O médio internacional português é, como já se esperava, um enorme upgrade para o meio-campo do Benfica. Onde antes havia anarquia, vertigem, demasiado risco e inconsequência, agora há critério, fluidez, rigor e gestão do ritmo de jogo, acelerando ou pausando de acordo com “aquilo que o jogo pede”.

 

 

Rui Vitória foi incapaz de corrigir as lacunas demonstradas pela sua equipa na 1ª parte e o Benfica chegou, naturalmente, à vantagem logo aos 5 minutos da etapa complementar. Pizzi apareceu enfim no momento da criação e com um movimento da direita para o meio, encontrou Rafa na grande área dos russos. Este, após uma “tabelinha” com João Mário que deixou os defesas pregados ao relvado, fuzilou as redes do desamparado Maksimenko.

 

 

Com o Spartak obrigado a arriscar mais, as águias tinham mais espaço para contra-atacar. Porém, a definição das transições ofensivas deixou a desejar e impediu que o golo da tranquilidade chegasse mais cedo.

 

O 2º golo surgiria num lance de ataque organizado, já com Gilberto e Everton em campo nos lugares de Diogo Gonçalves e Pizzi (Gonçalo Ramos substituíra o lesionado Seferovic ainda na 1ª parte), curiosamente da autoria do lateral brasileiro. Lucas Veríssimo tentou um passe pelo chão para Everton a queimar linhas adversárias, a jogada não deu frutos, Rafa pressionado e em esforço, já depois de ganhar um ressalto, conseguiu entregar a Weigl e o alemão fez algo que parece simples e que dá pouco nas vistas, mas que é um excelente exemplo daquilo que ele pode oferecer, com bola, à equipa. Apesar do passe “à queima” do colega, reciclou a posse de bola, com um passe lateral para Lucas Veríssimo, que permitiu àequipa manter a bola e evitar um contra-ataque perigoso do adversário. O central brasileiro voltou a tentar novo passe semelhante ao de momentos antes, desta vez para Gilberto, que em boa posição não desperdiçou.

 

 

O Benfica ficou confortável no jogo e, apesar do jogo se ter descaracterizado um pouco nos últimos 10/15 minutos, fruto do cansaço e das substituições, nunca viu a sua baliza ameaçada por um inofensivo e incapaz Spartak.

 

João Mário foi o melhor jogador em campo, bem secundado por Rafa. Weigl fez uma boa 1ª parte e Lucas Veríssimo rubricou uma excelente 2ª parte. Com 2 ou 3 intervenções vistosas, Vlachodimos desfez o pouco que teve para desfazer e parece partir na frente da luta pela baliza encarnada (quiçá a expulsão de Hélton Leite na final da Taça de Portugal e consequente suspensão na jornada inaugural do campeonato possa ter alguma influência). Uma nota final para Gilberto que, depois de uma pré-época sem concorrência direta e onde foi o jogador mais utilizado, foi relegado para o banco por Diogo Gonçalves (o qual, devido a lesão, não tinha somado qualquer minuto nos amigáveis) no 1º jogo oficial. O brasileiro, um dos patinhos feios do plantel, não esmoreceu e coroou a sua exibição enérgica com um golo pouco habitual.

 

Em suma, não obstante a débil oposição do Spartak, o Benfica entrou com o pé direito em 21/22, com um desempenho sólido e que abre perspetivas de melhoria significativa da qualidade exibicional face à temporada transata. E se na época passada, os encarnados falharam em quase todos os desafios de grau de dificuldade elevado e/ou importância máxima (PAOK; Porto, Sporting e Braga no campeonato; jogos da Liga Europa contra Rangers na fase de grupos e Arsenal nos 1/16 final; Supertaça; meia-final da Taça da Liga e final da Taça de Portugal), iniciar a competição com uma vitória na Rússia é certamente um indicador positivo.

 

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Como irá Jorge Jesus montar a equipa em jogos com um grau de dificuldade teoricamente inferior, em que o Benfica se veja na obrigação de assumir a totalidade das despesas do jogo, com uma linha defensiva mais subida no terreno? Manterá o 3-4-3? Ou optará pelo 4-1-3-2, que tem sido a sua imagem de marca ao longo dos anos e que permite incluir um maior número de jogadores de propensão ofensiva? Como irá o Benfica reagir nos jogos em que não possa contar com João Mário?

 

Duas dúvidas que podem ser desfeitas já no próximo sábado, em Moreira de Cónegos, dado que o médio português está suspenso para esse desafio. Irá Jorge Jesus aproveitar esta ausência para lançar já Meïté, fazendo valer os seus atributos físicos nesta deslocação tradicionalmente complicada?

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Para mais tarde deverá ficar guardada a estreia de Yaremchuk, pelo menos como titular, mesmo tendo em conta a lesão de Seferovic, o que deverá permitir nova oportunidade para Gonçalo Ramos, assumindo que Carlos Vinícius não conta para Jorge Jesus, como parece ser o caso. Por esclarecer, para já, ficarão os papéis reservados a Waldschmidt (que se foi eclipsando ao longo da temporada passada) e, especialmente, de Everton (que fez um trajeto inverso ao do avançado alemão, terminando a época em crescendo), assim como ao lesionado Darwin Núñez, a contratação mais cara de sempre do clube da Luz e que, à data de hoje, parece ter um longo caminho a percorrer para poder almejar a titularidade.

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